Todos me indicam o caminho contrário.
Bebi na música
E fechei-me a sós com o sonho.
Quando acordei
Haviam destruído os gramofones
E a treva anterior envolvia a cidade.
O mar passava nos braços
Uma pulseira de mortos.
Abri um pé de magnólia
Dando sombra ao Minotauro.
Desde então
Meu peito é zona de guerra,
Fiz um eixo com as estrelas.
A poesia em paraquedas
Tanto desce como sobe.
(…) O arranjo é dos mais complexos,
as fronteiras entre esses elementos estão longe de ser
demarcadas, de modo que a impressão é de coisa inextricável.
Imagens como a do mar com sua “pulseira de mortos”
e, sobretudo, aquela do “pé de magnólia”,
aberto pelo poeta para dar “sombra ao Minotauro”,
são algumas das dificuldades a enfrentar. Mas há
outras. Fala-se do despertar sobressaltado do poeta,
depois do seu fechamento solitário com o sonho e a música;
o sobressalto advém da consciência da tragédia
coletiva como fato já consumado, diante da qual é forçoso
posicionar-se (“Desde então meu peito é zona de
guerra”). Murilo Marcondes de Moura In:
MOURA, Murilo Marcondes de. O mudo sitiado: a poesia
brasileira e segunda guerra mundial. São Paulo: Editora
34, 2016. |
Murilo Monteiro Mendes (Juiz de Fora, 13 de maio de 1901 — Lisboa, 13 de agosto de 1975) foi um poeta, prosador e crítico de artes plásticas brasileiro, católico expoente do surrealismo na literatura brasileira.(Wikipedia)