descobertas
1.
escrevo um som agudo
que sobe e silencia
é um ruído antigo
intervalado
muito rápido
feito muito bem feito
por alguns pássaros
às vezes escuto
que a poesia
salva o instante
que é uma pedra
na água nos bolsos
retorno não garantido
mas ninguém diz
é também um laser
cirurgias corretivas
olhos que não mais
se embaçam
estamos sós
neste modo de dizer
e dizemos
ao mesmo tempo
é um impulso
uma fibra óptica
2.
cada poema que li
e não copiei o verso brilhante
cada prato raso de plástico
que precisei raspar o feijão
cada ponto de costura
desfeito quando vesti a roupa
cada vírgula que engoli
porque o silêncio é faminto
e a pausa é o braço longo
de um amor que não sei
a quem devolver
3.
deixo passar a tarde
e também seu rosto
embaçado de barro
nódoas de maçã
e pixels
falo pouco bem baixo
na frequência necessária
para soprar
palavras de amor
que pingam assim
miúdas minguadas
como se o barulho
do meu coração
pudesse abafar
o que não digo
agora é mais tarde ainda
cancelo a viagem
o quarto macio
desisto da casa
de outros filhos; apenas
uma das mãos vazias
com o resto do corpo
puxo o mundo para perto
e restamos no livro
como um plano um tecido
o tijolo sozinho na parede
outro modo de falar
4.
o mundo é este monólogo
estamos parados sem amantes
ouvindo a música das pedras
com as mãos ocupadas
pensando em
Nathália Lima é poeta, escritora e professora. Tem mestrado em estudos literários pela UFV. Nasceu em Barbacena, MG, e vive em Belo Horizonte. Escreveu “Istmo” (Urutau, 2023), semifinalista do prêmio Oceanos; tem poemas publicados nas revistas literárias Ruído Manifesto e Leituras.org.